Nunca se falou tanto em comunicação não-violenta. Existem cursos longos e rápidos, online e presenciais, para quem não conhece e para quem deseja se aprofundar. E isso, claro, é muito bom. Como facilitadora da CNV, é gratificante participar de discussões cada vez mais ricas sobre o tema e testemunhar pessoas transformadas por meio dessa metodologia.
Contudo, mais do que apenas falarmos da comunicação não-violenta, que eu passarei a chamar de CNV, quero estimular um pouco mais a sua prática. Nas palavras de seu autor, Marshall Rosenberg, por meio da CNV é possível promover o respeito, a atenção, a empatia e gerar o desejo mútuo de nos entregarmos de coração.
CONHECENDO SEUS PASSOS
Algumas pessoas confundem a comunicação não-violenta com ser excessivamente delicado, falar sempre baixo, nunca entrar em um conflito… o que não representa os princípios da CNV. A CNV nos ajuda a reformular a maneira pela qual nos expressamos e ouvimos os outros.
Apesar de ser um desafio, Rosenberg, psicólogo e criador da CNV traduz esse processo em quatro etapas que nos direciona para a prática constante de seus princípios:
Observação: o primeiro passo é observar o fato claramente, sem acrescentar nenhuma avaliação ou julgamento. Por exemplo, ao invés de “nesta empresa as pessoas nunca são promovidas!”, que tal “A última promoção de nossa área aconteceu há mais de dois anos!”. Assim, retiramos o julgamento e nos ancoramos em fatos.
Sentimento: muitas vezes ficamos com receio de expressar nossos sentimentos e isso pode ter múltiplas raízes, que envolvem desde um padrão cultural até mesmo experiências traumáticas. Em muitos ambientes corporativos, essa prática é ainda mais reprimida. Porém, Rosenberg identifica a aceitação e verbalização do sentimento como algo fundamental na CNV. Um exemplo é, ao invés de “Vocês não me valorizam nesta empresa”, que tal “Sinto-me desanimado com nossa política de promoções”. Novamente, não nos limitamos a nossa percepção e, ao expressarmos nossas vulnerabilidades, caminhamos em busca da resolução dos conflitos.
Necessidade: na maioria das vezes quando nossas necessidades não estão sendo atendidas, a tendência imediata é culpar algo ou alguém, o que pode originar novos conflitos ainda mais complexos. Ao assumirmos nossas necessidades, estamos trazendo para nós a responsabilidade sobre o nosso sentimento e não o terceirizando como é comum acontecer. Fica bem melhor dizer “fico triste porque não sou promovido, porque eu esperava esse reconhecimento depois te tanto esforço” do que simplesmente “fico triste porque vocês não me promovem!”. É preciso aprendermos a valorizarmos nossas necessidades… ou os outros também não valorizarão!
Pedido: por fim, no último estágio deve ser feito um pedido de forma clara, positiva e concreta. Quanto mais específicos formos, maiores as chances de sermos atendidos. É possível substituir “Quero que você compreenda porque eu mereço ser promovido” por “gostaria de ouvir o que posso realizar para aumentar minha chance de promoção”.
ENCONTRANDO RESISTÊNCIAS
Como facilitadora, sei que colocar estes princípios em prática pode ser um enorme desafio. Além de lidar com as resistências interna:
O que vão pensar de mim?
Isso aí só funciona com outros mercados, o meu é técnico!
Você não conhece o meu chefe…
Também precisamos lidar com as resistências externas.
Quer dizer que você está me chamando de violento?
Por que você não vai logo direto ao ponto?
Isso aqui é empresa, não filantropia!
Sei o quanto pode ser desafiador, afinal, já ouvi muito relatos semelhantes aos que descrevi acima. Apesar disso, quero te encorajar a dar este primeiro passo. A CNV baseia-se em habilidades de linguagem e comunicação que fortalecem a capacidade de continuarmos humanos, mesmo em condições adversas. E quer falar em um ambiente com condições mais adversas que o ambiente corporativo?
Mas, assim como descrevi no início do artigo, a busca pela linguagem de paz que simplifica diálogos e alcance resultados efetivos, está em constante ascensão. Se ainda não chegou até você, esse movimento em breve chegará. Você pode ser o percussor disso tudo em seu ambiente de trabalho, influenciando pessoas e convidando a essa troca sincera.
E, nas palavras de Margaret Mead: nunca duvide que um pequeno grupo de pessoas conscientes e engajadas possa mudar o mundo. De fato, sempre foi assim que o mundo mudou!
Algo a ser notado é que a CNV e os seus princípios estão longe de ser uma receita de bolo, o importante é entender cada um deles e trazê-los para a sua realidade e interações, praticando essencialmente os ensinamentos em busca de uma comunicação eficiente, convergente, assertiva e respeitosa.
MAS A CNV VAI RESOLVER SEMPRE?
A resposta é não!
Porém, apenas a iniciativa de convite a reflexão já é um grande passo em direção ao mundo que queremos construir! Então, finalizo com o convite para que possamos fazer de nossas vidas um fluxo de compaixão entre nós e os outros com base numa entrega mútua, do fundo do coração.