Um dos caminhos mais “comuns” ou recorrentes ao se olhar o processo de ascensão organizacional se dá em transformar um técnico em líder. O que em geral não é a mesma coisa, nem necessariamente o melhor caminho.
Aliás, antes de aprofundar neste tema é preciso fazer uma clarificação quanto a terminologia. Na maioria das organizações, principalmente privadas, o processo não é precisamente de ascensão, mas sim, de assunção, qual a diferença? Ascender significa subir por suas próprias forças, já a assunção significa elevar-se pelo auxílio de outro.
Na maioria dos casos se a organização não notar os seus valores e as suas competências você dificilmente poderá ascender na hierarquia organizacional, portanto, é precisa fazer-se notar.
Feito este excurso vamos ao tema principal deste artigo. Qual é a função de um líder? Existem muitas definições para isso, porém gostaria de propor uma mais básica e existencial. Liderar é desenvolver, implementar e acompanhar estratégias de gestão do desejo.
Como assim? Cada um de nós ao tomarmos decisões, e entrar em uma empresa é uma decisão, estamos buscando alguma coisa: dinheiro, sustento, carreira, currículo, renome. Este ‘buscar alguma coisa’ é um desejo. Entretanto, o fato de desejar não se esvai ao começarmos o nosso trabalho. Continuamos desejando e, em muitos casos, o desejo tende a se ampliar.
Porém, o que é o desejo. Tradicionalmente na história do pensamento ocidental encontramos duas definições para ele. A primeira, platônica, que afirma que o desejo é fundamentalmente falta, isto é, eu desejo alguma coisa porque ainda não a possuo. O segundo, de caráter espinozinano afirma que o desejo é potência, é possibilidade, e por isso, somos seres de desejo para nos tornarmos ainda mais humanos.
Vamos pensar estas duas características dentro do ambiente organizacional que é repleto de desejo, sonhos e expectativas. grande parte das pessoas ao entrarem em permanecerem dentro de uma instituição o fazem não apenas porque estão ganhando dinheiro dentro dela, mas sim, devido ao fato de estar ali fazer com que elas encontrem alguma satisfação e bem-estar subjetivo. Traduzindo em outras palavras, as pessoas permanecem nas instituições porque, em certa medida, se realizam e são felizes dentro delas. Elas podem até entrar por dinheiro ou status, mas não permanecem por isso.
Daí o papel do líder. Como muitos líderes ascenderam de cargos técnicos para a gestão, muitas vezes sem a devida preparação comportamental o que se vê é que eles continuam reproduzindo o modelo técnico e se preocupam pouco com elementos essenciais no processo da gestão dos desejos e das expectativas, tais como a cultura organizacional, a saúde mental, a saúde emocional e o engajamento e a percepção dos colaboradores e dos clientes.
É muito comum nas organizações escutar líderes falando de melhoria contínua e de inovação. Em geral, quando eles falam disso se subentende que eles estão pensando em processos e em tecnologia, na minha opinião, dois erros crassos.
O processo de transformação da cultura organizacional de uma empresa passa pelo entendimento e pela gestão do desejo. É preciso que o líder se prepare para isso passando de um técnico de processos a um gestor de expectativas e sonhos.
Quantas consultorias e treinamentos falham porque olham demasiado para os processos e para as rotinas e se preocupam pouco com os desejos e as expectativas dos colaboradores e dos clientes. É preciso criar uma gestão dos sonhos e das expectativas assim como criamos e implementamos uma gestão de processos e de métodos. “Mas isso é muito subjetivo”, poderiam dizer. É aí que você se engana, há métodos e estratégias específicas para fazer este tipo de gestão, muitos deles baseados em modelos como o Community Canvas, o Design Thinking e o Customer Center experience e muitos outros sendo desenvolvidos e testados.
A qualidade de uma organização não está apenas na eficácia e eficiência dos padrões, métodos, indicadores e resultados, mas também, na taxa de satisfação com a vida daquelas pessoas que ali estão ou que com ela entram em contato.
Pense nisso! Como é o seu estilo de liderança?
Gillianno Mazzetto, PhD é co-founder da EiPSI