As cidades inteligentes são atualmente desejo de consumo das autoridades municipais no Brasil e no mundo. Esse tipo de cidade, mais do que vias e construções, são constituídas de dados, que se por um lado ajudam a melhorar a qualidade de vida da população ao otimizar serviços e ações públicas, por outro lado capturam boa parte da privacidade dos cidadãos com enormes bancos de dados que podem ter sua segurança violada. É nessa dicotomia que vem emergindo o conceito e instrumentos tecnológicos para tornar as cidades mais inteligentes.
Em todo o mundo, cidades antigas foram adaptadas e algumas novas cidades estão sendo construídas em terrenos totalmente renovados, totalmente planejadas e orientadas para serem inteligentes desde os primeiros projetos de planos. Quanto mais antiga e mais desenvolvida for uma cidade, mais complexo é para adaptar e se adaptar.
Economias emergentes como a China e a Índia estão investindo pesadamente em cidades que são forjadas como modelos de vida urbana sustentável, combinando as mais recentes tecnologias avançadas de informação e comunicação com o projeto arquitetônico de ponta totalmente integrado em ambientes urbanos onipresentes.
De muitos pontos de vista, as cidades inteligentes não são apenas uma tendência de moda, elas são vistas como necessárias para toda a civilização. Apresentam-se como uma solução sustentável para a vida urbana. Soluções relacionadas ao gerenciamento de água, energias limpas e renováveis, redes inteligentes, controle inteligente de tráfego, governo eletrônico, mobilidade urbana, acessibilidade à internet sem fio e gerenciamento de resíduos são apenas alguns exemplos que podem ser destacados em uma longa lista de soluções propostas orientadas à resolução dos problemas urbanos.
O desafio não é a tecnologia em si, mas como projetar e usar a tecnologia para o benefício real do bem-estar dos cidadãos. O problema é o outro lado da moeda. A coleta de dados privados pelos sensores das smart cities. Antes, as empresas de construção civil eram as construtoras das cidades. Agora são as empresas de tecnologia que estão entrando na concorrência para construir as cidades inteligentes. Uma radical mudança que ocasiona outros impactos, como a coleta dos dados privados, por meio de milhares de sensores via inteligência artificial, em toda a cidade. Os dados são o negócio dessas empresas.
Um plano de saúde pode não cobrir o tratamento de seu colesterol ou de um ataque cardíaco, após detectarem que em seu histórico no supermercado está registrado a compra de carne vermelha por mais de 2 anos seguidos e nenhuma matrícula em academia. Ou, o seguro de seu carro pode custar R$ 500,00 mais caro se você levou duas multas por excesso de velocidade no último ano.
A China está introduzindo um sistema de crédito social até 2020. Esse sistema irá permitir ou inibir, por exemplo, a moradia em certos lugares, viagens dentro do país ou para o exterior, matrícula dos filhos em algumas escolas em específico, acesso a restaurantes, etc. Tudo a depender de sua pontuação social, ou seja, o número de “likes” irá definir quem você é.
Pelo lado bom, no Nordeste brasileiro, Salvador é a única cidade da região no ranking IESE Cities in Motion Index, que elenca as smart cities (cidades mais inteligentes) do mundo. A capital baiana ocupa a 147ª posição no ranking internacional, num ranking de 165 cidades e que traz Nova York (EUA) como a primeira colocada pelo segundo ano consecutivo. A cidade ocupa ainda a quinta posição entre as seis únicas brasileiras na listagem do IESE Business School.
As outras representantes nacionais são: a capital paulista, na 116ª colocação e a primeira entre as smart cities nacionais; Rio de Janeiro, na 126ª posição e a segunda entre as brasileiras; Curitiba, na 135ª, terceira colocada; Brasília, na 138ª e quarta posição; e Belo Horizonte, na 151ª posição e a sexta, respectivamente. É um importante reconhecimento para a cidade, num ranking que leva em conta o capital humano, coesão social, economia, meio ambiente, governança, planejamento urbano, alcance internacional, tecnologia, mobilidade e transportes.
Contudo, as posições das cidades brasileiras nesse ranking mostram o quão distantes estamos, seja do Black Mirror traçado para as cidades inteligentes mais conectadas, seja do exemplo de cidadania e sustentabilidade, quando olhamos para as capitais nordestinas e nem as calçadas, nem a coleta seletiva de lixo são padronizadas. Garantindo mobilidade e sustentabilidade ambiental.
E, hoje, não sei o que é pior, perder os dados, mas ter mais qualidade de vida, como eu vi nas cidades chinesas que visitei, ou manter minha privacidade e abrir mão da cidadania, como vemos todos os dias nas cidades brasileiras.